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Aula: Histerossalpingografia (HSG)

Um guia aprofundado sobre a avaliação da infertilidade feminina.

Parte 1: Introdução e Conceitos Fundamentais

1.1. O que é a Histerossalpingografia?

  • Definição: Exame radiológico contrastado, minimamente invasivo, que avalia a cavidade uterina e a permeabilidade das tubas uterinas.
  • Princípio Básico: Instilação de contraste iodado através do colo do útero para visualizar a cavidade endometrial e as tubas sob fluoroscopia.
  • Status Atual: Exame de primeira linha na investigação básica da infertilidade feminina.

1.2. Indicações Principais

  • Investigação de Infertilidade: Principal indicação, avaliando fatores tuboperitoneais.
  • Avaliação de Anomalias Müllerianas Congênitas: Útero septado, bicorno, etc.
  • Investigação de Abortamentos de Repetição.
  • Avaliação de Sinéquias Uterinas (Síndrome de Asherman).
  • Suspeita de Pólipos Endometriais ou Miomas Submucosos.
  • Controle Pós-Cirúrgico (pós-histeroscopia ou reversão de laqueadura).

1.3. Contraindicações e Riscos

  • Contraindicações Absolutas: Gravidez e infecção pélvica ativa.
  • Contraindicações Relativas: Alergia ao contraste iodado, sangramento uterino ativo.

Parte 2: Anatomia Radiológica do Trato Reprodutivo Feminino

2.1. O Útero

A cavidade endometrial tem uma forma triangular ou "em leque" na HSG. As porções superiores são os cornos uterinos, onde as tubas se inserem.

2.2. As Tubas Uterinas (Trompas de Falópio)

Segmentos cruciais para a interpretação:

  1. Intersticial/Intramural: Porção inicial, estreita, dentro da parede uterina.
  2. Ístmica: Segmento reto e fino.
  3. Ampolar: Segmento mais longo, dilatado e tortuoso, local comum da fertilização.
  4. Infundíbulo: Porção final com as fímbrias, que se abrem para a cavidade peritoneal.
Anatomia do Útero e Tubas Uterinas
Diagrama anatômico do útero e dos segmentos das tubas uterinas.

2.3. Espalhamento Peritoneal

É o objetivo final do exame. O contraste que atravessa as tubas patentes espalha-se livremente na cavidade peritoneal, aparecendo como "poças" irregulares ao redor das alças intestinais. Isso confirma a permeabilidade tubária.

Parte 3: Técnica do Exame, Protocolo e Segurança

3.1. Preparo e Timing Cíclico (CRÍTICO)

  • Timing: Realizado na primeira metade da fase folicular (entre o 6º e 12º dia do ciclo) para evitar gravidez inicial e garantir um endométrio fino.
  • Precauções: Abstinência sexual, rastreio para ISTs e profilaxia analgésica (ex: ibuprofeno 30-60 min antes) para reduzir dor e espasmo tubário.

3.2. Sequência de Imagens Passo a Passo

  1. Posicionamento e Preparo: Paciente em posição ginecológica, inserção de espéculo e antissepsia do colo.
  2. Cateterismo Cervical: Inserção de um cateter com balão para vedar o canal cervical.
  3. Injeção do Contraste: Injeção lenta e gradual sob visão fluoroscópica.
  4. Aquisição de Imagens-Chave: Imagem inicial do preenchimento, imagem da cavidade distendida (uterograma), imagens do preenchimento das tubas e, a mais importante, a imagem do espalhamento peritoneal (salpingograma).

Parte 4: Interpretação de Imagens: Achados Normais

Um exame normal mostra uma cavidade uterina triangular com contornos lisos, tubas uterinas finas e sinuosas preenchendo-se progressivamente, e um espalhamento livre e bilateral do contraste na cavidade peritoneal.

HSG Normal com Espalhamento Bilateral
HSG normal mostrando cavidade uterina, ambas as tubas preenchidas e espalhamento peritoneal livre (Cotte positivo bilateral).
HSG Normal com Espalhamento Bilateral
HSG normal mostrando cavidade uterina, ambas as tubas preenchidas e espalhamento peritoneal livre (Cotte positivo bilateral).

Parte 5: Aplicações Clínicas e Achados Patológicos

5.1. Patologias Tubárias

  • Obstrução Tubária: O contraste para em um segmento, sem espalhamento. Se for distal, pode formar uma Hidrossalpinge (tuba dilatada e tortuosa).
  • Salpingite Ístmica Nodosa (SIN): Múltiplos pequenos divertículos na porção ístmica da tuba.
  • Doença Adesiva Pélvica: Espalhamento peritoneal limitado e encapsulado.

5.2. Patologias da Cavidade Uterina

  • Sinéquias Uterinas: Defeitos de preenchimento lineares e irregulares.
  • Miomas Submucosos / Pólipos: Defeitos de preenchimento arredondados e bem circunscritos.

5.3. Anomalias Müllerianas

  • Útero Septado: Septo mediano dividindo a cavidade, com contorno externo uterino normal (convexo).
  • Útero Bicorno: Dois cornos uterinos com indentação externa profunda (>1 cm).
Imagem de Hidrossalpinge
HSG mostrando hidrossalpinge bilateral: as tubas estão dilatadas e o contraste fica retido, sem espalhar para a cavidade.
HSG Normal com Espalhamento Bilateral
HSG Útero Bicorno: Dois cornos uterinos com indentação externa profunda (>1 cm).
HSG Normal com Espalhamento Bilateral
HSG Útero Septado: Septo mediano dividindo a cavidade, com contorno externo uterino normal (convexo).

Parte 6: Resumo e Encerramento

A HSG é um exame de custo-efetivo e alto valor diagnóstico no rastreio da infertilidade feminina. Sua correta interpretação é fundamental para guiar os próximos passos, seja um tratamento clínico, uma cirurgia (histeroscopia/laparoscopia) ou a indicação de fertilização *in vitro* (FIV).